No dia de hoje, o Governador do Estado
de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), dá início ao programa de internação
compulsória de dependentes de crack. O plantão jurídico que irá acelerar o
processo, tomará lugar no bairro da Luz, apelidado pela imprensa de
cracolândia.
Nós da ANEL não temos a menor ilusão acerca do
que se trata esta política imposta pelo Governo. Trata-se de mais um capítulo
na desastrosa política que veio a ser conhecida como "Guerra às
Drogas" - que pouco tem haver com drogas, e muito tem haver com a
criminalização da pobreza.
Inaugurada pelo presidente americano Richard
Nixon, a guerra foi inicialmente orçada em cem milhões de dólares. Quarenta
anos depois, os EUA gastaram mais de UM TRILHÃO DE DÓLARES com a guerra. Apesar
desse brutal investimento em armamento, treinamento policial e militar,
inteligência, campanhas publicitárias, etc., os números não deixam mentir:
desde 1970 o número de usuários americanos não diminuiu, mas aumentou em mais
de 10 milhões. Esta estratégia está sendo mundialmente questionada, e em muitas
e importantes instâncias já é reconhecida como fracassada.
O Governo do Estado de São Paulo, por sua vez,
nunca investiu pesadamente em políticas que visem melhorar a vida dos mais
pobres, muito menos daqueles que vivem em situação de marginalidade ou
dependência química. Mas não é a primeira vez que ele investe em políticas
repressoras, de caráter policialesco, e de encarceramento em massa. Nesse
tocante, temos um longo e tortuoso histórico. Por exemplo, ao dar início ao
processo de criminalização dos moradores de rua da região da Luz, assistimos
inúmeras cenas de violações dos direitos humanos mais elementares, sendo
transmitidas pela televisão. Nomeada pelas próprias autoridades de
"Operação Dor e Sofrimento", a polícia militar foi acionada pelo
Governador para coagir, perseguir e prender os moradores de rua. Foi então que
estudantes e trabalhadores se uniram em sua defesa, no que ficou conhecido como
o "Churrasco da gente diferenciada na Cracolândia". Diziamos em alto
e bom som que ser pobre não é crime, mas o que muitos políticos fazem, é. Que a
política do Governo do Estado de São Paulo é criminosa. Mas apesar dos apelos
sinceros da população, o Governo Federal, tido ainda por muitos como antagônico
às políticas do PSDB, se mostrou novamente omisso, se calando, e nada fez para
intervir no sentido de dar outros rumos à situação.
Em comparação com outros países, que aprovaram a
descriminalização, e estão alcançando resultados positivos no tocante à redução
de danos provocados pelas drogas, com investimentos pesados em educação,
conscientização e tratamentos de saúde, o Governo do Estado de São Paulo
decidiu ir na contramão da história - em alta velocidade. Há motivos para isso.
A região da Luz é alvo de uma intensa campanha por parte das empresas de
especulação para a construção de um novo conceito de bairro no local. O
conceito de bairro sem pobres, claro! Mas isso não quer dizer que essas empresas
queiram acabar com a miséria, mas sim expulsa-la para regiões distantes. A
idéia é demolir tudo, para reconstruir depois, com financiamento público, e
para o lucro da iniciativa privada. O projeto da "Nova Luz"
simplesmente não atende nem os interesses dos moradores regulares da região.
Ainda assim, o que fazer em relação aos
moradores de rua divide opiniões. É evidente que não se pode virar as costas às
pessoas em situação de extrema vulnerabilidade. Porém, a
"alternativa" decidida pelo Governador já se provou um erro em
diversos outros países. Ninguém reage bem a nenhum tratamento ao qual é
submetido à força. Até porque boa parte deles não são sequer usuários de crack.
Muitos deles são pessoas que perderam suas casas, ou delas foram expulsos, ou
ainda são pessoas que tem problemas mentais e acabaram se perdendo de seus
familiares e amigos. O estigma lhes foi assim imputado, maldosamente, para
enganar setores importantes da população, para que estes fossem também
coniventes com a prática higienista.
A ANEL, por outro lado, defende que a saída para
a questão das drogas, é a descriminalização, a legalização e a estatização da
produção de todas as drogas lícitas e ilícitas. Assim rompemos definitivamente
o ciclo do tráfico de drogas, que, por sua vez, alimenta imensamente o tráfico
de armas. O Brasil deixaria de ser o terceiro país que mais prende seus
cidadãos, atrás somente dos EUA e da China. Dos quase 500 mil encarcerados
hoje, no Brasil, um quarto está preso por crimes relacionados a drogas. Somente
com a descrminalização, o usuário comum, que venha desenvolver dependência, se
sente confiante em vir procurar ajuda médica pois sabe que não irá ser punido,
destratado, humilhado ou aprisionado. A legalização, por sua vez, irá servir
para garantir que haja um controle sobre a qualidade do produto consumido,
diminuindo imensamente a quantidade de pessoas infectadas com as mais diversas
doenças. Com a estatização, podemos ainda garantir a qualidade de vida e de
trabalho das pessoas envolvidas na produção. Os lucros das vendas podem ainda
ser revertidos justamente para manter as políticas de saúde e educação que
previnam a dependência.
Sabemos que os Governos
Estaduais e Federal tem ciência de tudo isso. Mas não agem nesse sentido,
porque lhes é conveniente usar do argumento de "Guerra às Drogas",
sempre que precisam atacar os mais pobres. Assim, chamamos todos os estudandes
do Estado a se mobilizarem contra essa política, a se incorporarem aos atos
contra a internação compulsória na Luz, pela legalização das drogas, atuando
com os movimentos sociais em defesa da população negra e pobre, vítima do
genocídio cotidiano. Somente com mobilização nas ruas poderemos mudar esse
cenário!